quinta-feira, 21 de junho de 2007

Estamos pertante um Estado Social?

in alamedadigital.com.pt/n8/



Incredulidade foi a primeira sensação que me assaltou quando me contaram a seguinte «história».
Em 1995 ocorreu um dos muitos acidentes de viação que infelizmente se continuam a verificar com demasiada frequência nas estradas portuguesas. Um homem de meia-idade, trabalhador anónimo que seguia pela berma da estrada foi atropelado, tendo falecido de imediato. Cumprindo a obrigatoriedade imposta por lei, a viatura encontrava-se abrangida por seguro contra terceiros.
A vítima encontrava-se abrangida pelo sistema de segurança social oficial instaurado pela previsão da Constituição da República Portuguesa, para o qual descontava mensalmente o quantitativo que lhe havia sido fixado em função da actividade que desenvolvia e dos réditos que dela obtinha.
Porque o sistema de segurança social prevê a protecção dos trabalhadores e suas famílias em diversas situações, entre as quais a de morte, veio entretanto a viúva a requerer a correspondente pensão de sobrevivência. O que lhe foi deferido, tendo-lhe sido arbitrada pelos serviços de Segurança Social uma pensão, cujo quantitativo se situava entre os 130,00 e os 140,00 euros mensais.
Não interessa para o resto da história a bondade das razões que levaram a companhia de seguros a não aceitar de imediato a sua responsabilidade na morte ocasionada pelo acidente. Não seriam, contudo, muito sólidas tais razões: não conformada com elas, a viúva levou a matéria a tribunal, para o que teve de contratar os serviços de um advogado. Volvidos anos (como é da praxe), o tribunal, examinando os factos e atendendo ao mérito da argumentação desenvolvida pelas partes, veio a condenar a companhia de seguros a pagar indemnização aos familiares da vítima mortal. Indemnização quantificada em, por um lado, danos patrimoniais e, por outro, danos não patrimoniais. Decisão que foi acatada pela ré.
Há dias, decorridos cerca de 12 anos sobre o acidente de viação, a viúva recebeu da Segurança Social a comunicação de que a pensão de sobrevivência que lhe havia sido arbitrada (não me foi referido quando lhe começou a ser paga) deixaria de lhe ser abonada até que se verificasse a sua concorrência com o valor de cerca de vinte mil euros, recebido da companhia de seguros a título de indemnização (suponho que por danos patrimoniais).
Tudo sob invocação de certas disposições de uma lei que em 1984 definiu as bases em que assenta o sistema de Segurança Social (Lei nº 28/84, de 14 de Agosto) e que, a despeito das últimas reformulações, se mantêm em vigor.
Terão, assim, os serviços da Segurança Social zelosamente aplicado a lei ao tomarem conhecimento desta «aberrante» situação (o cerco às «fraudes à lei» vai sendo apertado por via das novas tecnologias e da imposição às empresas de lhe reportarem determinadas factualidades).
Ao dar corpo a esta triste e mesquinha história, não é minha intenção fazer exegese jurídica, para a qual de resto não tenho a necessária competência.
Com o caso apenas pretendo pôr em realce que o Estado, a despeito de exigir que empregadores e trabalhadores contribuam para o seu sistema de Segurança Social a fim de poder assegurar a estes últimos e a suas famílias protecção em determinadas situações (oh!, como é «limite» a situação de morte!), ao fim e ao cabo se escuda no cumprimento de obrigações assumidas por terceiros e decorrentes de negócio jurídico em que ele não foi comparte e de que objectivamente não é beneficiário, para se escusar a prestar a protecção que virtuosamente proclamou.
Não me parece minimamente razoável que o cumprimento por um terceiro de uma obrigação que este voluntariamente assumiu possa servir de justificação para que eu próprio não tenha que cumprir um outro compromisso a que me vinculei.
Não gostaria que me fosse objectado com a existência de obrigações sob condição. Creio bem que o domínio em que estas obrigações decorrem se não coaduna com a invocação de «Estado Social» a que o Estado Português se arroga.
Não nos encontramos mais há vinte e tal anos atrás. Os sistemas criam-se, desenvolvem-se e evoluem para que de todo não morram.
O esquema de subsidariedade que, com particular relevo para o caso de morte, informaria o pensamento e a legislação dos anos 80 e anteriores, aliás em mitigação do princípio retributivo que deriva da prestação prévia de contribuições com finalidade pré-determinada, não me parece adequado. Para um são e justo equilíbrio social as partes devem prioritariamente cumprir as obrigações que consubstanciam contrapartidas do que exigiram.
Com efeito, hoje encontra-se em aberto todo um vasto campo em que se podem pôr questões sobre o comportamento da Administração relativamente a eventual complementaridade de esquemas de segurança social .
Face às disposições legais de 1984 invocadas para o caso de que foi contada a história, em que termos é que, em presença de contrato respeitante à protecção de idêntico interesse firmado com instituições de socorros mútuos ou com empresas privadas, as pensões de reforma ou de sobrevivência asseguradas pelo sistema estatal de Segurança Social serão abonadas? Em tal contexto, quais os efeitos dos «seguros de vida» (recorde-se que o Estado até parece estimulá-los ao admitir, em sede de IRS, a dedução dos respectivos prémios para o cálculo da matéria colectável)?
Dado que o facto e o interesse protegido são rigorosamente «os mesmos», as instituições estatais de segurança social considerar-se-ão sub-rogadas nos direitos do «lesado» até ao limite do valor das prestações que lhes cabe conceder, como (pelos vistos) sucedeu com o caso vindo de relatar?
Conviria, a todos os títulos, que esta matéria fosse devidamente dilucidada pelos poderes públicos.
Sobretudo agora, que rigor, verdade e transparência são arvoradas em mote para todas as decisões, ainda as mais polémicas; sobretudo agora, que a todo o momento nos é pedida a atenção para «as letras miudinhas» contidas em algumas cláusulas contratuais de viagens, de seguros, de habitação temporária.
Também a lei não deve conter «letras miudinhas». O sistema nacional de segurança social terá que ser o possível face ao financiamento que lhe serve de suporte. Mas terá necessariamente que ser consequente nos fundamentos sobre que assenta, nos princípios que enuncia e na sua aplicação.
A justiça é um valor demasiado elevado para ceder o passo à apregoação de uma solidariedade pouco selectiva. Esta conferirá votos, mas exaure recursos (de que maneira!) e fere a sensibilidade dos observadores da realidade social e, sobretudo, das suas vítimas, que não vêem respeitados os direitos que as contribuições que prestaram lhes devem, antes de tudo o mais, indiscutivelmente conferir.
Voltando à história que a traços largos foi relatada, em termos práticos a viúva apenas verá retomado pela Segurança Social o pagamento da sua anoréxica pensão de sobrevivência, fundada em contribuições prestadas, ao fim de um período de tempo que, se as contas que fiz estiverem certas, rondará os 12 anos.
Há que confiar na Divina Providência, que não na providência do Estado Social tão proclamado pelos poderes públicos portugueses, para que a sua «beneficiária» ainda seja viva quando tal ocorrência tiver lugar.


4 comentários:

Ana Cristina Leonardo disse...

Resumindo: eu pago ao Estado, mesmo que pague a terceiros. O Estado não paga, se terceiros me pagarem. Como se costuma dizer: ou há moralidade ou comem todos, Infelizmente nem há moralidade nem todos comem

Anónimo disse...

estamos perenate o estado de sítio

Anónimo disse...

Que caso e não há jornais que façama denúnica do assunto????

Anónimo disse...

m que pa+ís vivemos: tiran-nosna tgek«la de arroz e háo há ninguém que defenda os mais desfavorecidos,
anorexia no dinheiro do pobre náo interessa